- Você tem medo da morte? Ah! Tem sim. Olha a sua cara!
E daí? O fato de a temer não significa que eu não a deseje, que não alimente essa sede de morte dentro de mim. Olha a minha cara? Ela pode não ser a de alguém que está com medo da morte e sim a de quem quer abrir a boca pra dizer tantas coisas, tantas palavras pontudas, afiadas feito lanças – para ferir e cortar. E sangrar. E calar.
O fato de abrir a boca para falar e só sentir o ar e fechar, faz do enigma um corrosivo estigma, que me impede de compartilhar o tanto que tenho que me transforma em nada. Não tem sentido, eu sei.
- Você tá bem?
E o que tenho? Lembranças tristes, alegres, um pouco de ressentimento, sonhos tão ambiciosos quanto loucos, anseios tão floridos quanto dispersivos. E as obsessões.
E o que de fato é ser obsessivo? Não cultivo com alegria a morte dentro de mim. Teme-la? Quem às vezes não a deseja? Quem não se fascina com o seu mistério, com a beleza sombria que cerca seu soturno império de corpos, vidas e mentes?
- Você está pálida, o que você tem? Me fala!
E por quê? Eu pergunto. Por que cultivar sentimentos ruins a meu próprio respeito? Degradar-me e me jogar na lama da padronização, que é algo que eu nem sei o que, pra quê e muito menos que eu nem sei dizer.
E se gostar de mim e não gostar dos outros? Ou não aprender a amar? Ou me entregar à soberba se achar que sou perfeita?
- Ei, responde! - Ele fala me chacoalhando.
Mas eu não quero morrer. Ainda não, tenho muito a fazer. Mas dá vontade de se atirar de um prédio quando não se consegue o que quer. Quando se tem a frustração de nem conseguir se expressar, quando se tem tanto a dizer ou perguntar...
Porém, só consigo me me sentir patética ao tentar gritar ou me esmurrar e apenas pensar que não e parar. Pareceria loucura.
Peraí. Afinal, o que é ser louca pode ser a questão. O que é ser louca quando se está acompanhada numa lanchonete lotada não é a mesma coisa quando se está trancada sozinha no quarto. Ou é tudo máscara, aparência, casca? Ou porque é deselegante quebrar a ordem estabelecida?
O que eu seria se me despisse dessas normas de conduta, estigmas, pré-conceitos, programas de televisão... Qualquer coisa que influencia a favor de quem está no poder?
Nem sei, seria uma pessoa vazia? Eu já estou vazia! Quanto mais se tem na aparência mais oco se fica?
E a imagem nebulosa entre as lágrimas nos meus olhos fixos se dissolve, como o término de uma serração, no dia seguinte. Insistir em perguntas sem respostas nem indícios é mera obsessão.
- Caramba (suspiro), você me assustou! O que foi?
Abaixo os olhos, permaneço muda.
- Ei, garçonete! - me olha atento - O que você vai querer?
"Por favor, garçonete, eu quero algumas respostas. E quero... e quero... deixa ver... ah, tá bom, as respostas já são caras o bastante."
"Por favor, garçonete, eu quero algumas respostas. E quero... e quero... deixa ver... ah, tá bom, as respostas já são caras o bastante."
- Um chope, nada pra comer. - encher a cara pode adiantar.
- Assim você vai desmaiar. - ele diz em tom de preocupação - Que bom que falou alguma coisa.
- O que... o que eu realmente quero, hun? Vai, por favor, alguém tem que me responder!
As palavras morrem outra vez, enquanto as lágrimas caem sem censura.
5 comentários:
"o querer destrói"
Acredito que a falta de perspectivas na própria vida detrua mais. A indefinição, a incerteza, os horizontes limitados. Divago...
*destrua
o querer faz parte da vida.
Sempre queremos e o querer destrói.
Sim, gera uma enorme frustração. Mas, pra mim, é uma faca de dois gumes. Prefiro querer muito e me frustrar do que querer pouco ou nada e não sonhar. ^^
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